Derrubada do marco temporal: os impactos para indígenas e ruralistas de SC 291m6e

O ND+ conversou com um antropólogo que explicou como se configura o marco temporal 304225

Após o STF (Supremo Tribunal Federal) derrubar a tese do marco temporal para demarcação de terras indígenas, nesta quinta-feira (21), por 9 votos a 2, a reportagem do ND+ conversou com entidades e profissionais atuantes no assunto para explicar os impactos da decisão em Santa Catarina.

votação do marco temporalMarco temporal foi derrubado pelo STF. Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil – Foto: Antônio Cruz/Agência Brasil/ND

Defensor e atuante na aprovação do marco temporal, o deputado estadual Mauro de Nadal (MDB) considera que a decisão do STF impacta no direito à propriedade.

Ele cita que o impacto atinge ao menos 800 famílias de pequenos produtores rurais estabelecidos na região.  Exemplos são terras localizadas no Oeste do Estado, em Cunha Porã e Saudades, e em Palhoça, na região da Grande Florianópolis.

“No meu modesto ponto de vista, a nossa Constituição não foi interpretada na sua literatura. A interpretação que foi dada acaba gerando uma insegurança no direito de propriedade”, avalia.

Conforme Nadal, Santa Catarina conta com uma composição diferente dos demais estados brasileiros, uma vez que é formada por pequenas propriedades rurais, mas que produzem como grandes propriedades e participam significantemente da economia do estado.

“Conheço bem a questão de Cunha Porã e Saudades, onde em 2007 foi gravada uma reserva de 2,7 mil hectares em áreas ocupadas há muitas décadas por 153 famílias de pequenos agricultores. Os indígenas que podem ser beneficiados não vivem na região, onde várias propriedades têm linha de sucessão familiar desde 1918”, explica.

Por isso, o deputado entende que o marco estabelecido com a promulgação da Constituição Federal, em 5 de outubro de 1988, para definir áreas ocupadas por indígenas, e o prazo de cinco anos estabelecido a contar daquela data para definir demarcações é definitivo.

“Especialmente em áreas ocupadas por outros brasileiros, absolutamente consolidadas, como em terras colonizadas há mais de um século, a partir de um processo que contou com a organização do Estado”, acrescenta.

Segundo Nadal, o próximo o é uma força-tarefa por parte dos parlamentares de Santa Catarina que possuem um posicionamento firme sobre a questão das pequenas propriedades rurais e a titulação dessas propriedades. “A força-tarefa será voltada ao convencimento dos senadores e uma mobilização ao presidente da República”.

Produtores rurais expressam preocupação

Faesc (Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina) se manifestou sobre as consequências da decisão do STF em não reconhecer a tese do marco temporal em relação à demarcação de terras indígenas. A entidade se diz com “extrema preocupação”.

Segundo a Faesc, a tese do marco temporal em hipótese alguma retira direitos de indígenas, apenas garante um critério objetivo para fins de efetivação de uma política de demarcações, sem subtrair o direito de propriedade das famílias rurais, e sem subtrair o direito dos povos originários.

No entendimento da entidade rural, a nova jurisprudência do STF gera imensa insegurança jurídica, ao contrário do que acontecia com o reconhecimento da tese do marco temporal, a qual criava um ambiente de confiança nas instituições da República Brasileira – especialmente no Poder Judiciário – e afastava a possibilidade de conflitos na zona rural.

“A FAESC teme a volta de um ado recente em que processos de demarcação de terras indígenas em território barriga-verde geravam muita angústia, tensão, medo e revolta entre centenas de famílias rurais que, ao final, viam-se desalojadas de seus imóveis rurais legalmente adquiridos e pacificamente ocupados”, pontuou a entidade.

Indústria de SC também se manifesta 1m4l4u

A Fiesc (Federação das Indústrias de Santa Catarina) vê com muita preocupação o julgamento do STF sobre o marco temporal da demarcação das terras indígenas.

Em nota, a entidade cita que “a revisão da jurisprudência, que tinha a Constituição Federal de 1988 como baliza temporal, fragiliza nossa segurança jurídica, trazendo intranquilidade ao campo e à cidade”.

A Fiesc pondera que a decisão do STF desconsidera as diferenças regionais brasileiras. “No caso de Santa Catarina, onde vivenciamos situações especialmente consolidadas em virtude de nossa colonização, é fundamental a modulação na aplicação da decisão, sob pena de sérias consequências econômicas e sociais. A FIESC trabalha para que a matéria ainda possa ser objeto de alteração legislativa, reconhecendo o direito dos índios e, ao mesmo tempo, preservando as áreas consolidadas pela Constituição de 1988, restabelecendo a segurança jurídica e a paz social”, destaca a nota.

A reportagem do ND+ tentou contato com a Funai (Fundação Nacional dos Povos Indígenas) para um posicionamento dos indígenas da região Oeste de Santa Catarina, mas não obteve retorno até a publicação. O espaço segue aberto para a manifestação dos indígenas.

Julgamento no STF que não reconheceu a tese do marco temporal – Foto: Carlos Moura/SCO/STF/ND

Impacto para os indígenas v2n41

Santa Catarina conta com 21.541 indígenas, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). O número é 18,2% maior em relação ao Censo de 2010. A maioria deles está concentrada no Oeste catarinense. Ipuaçu é a cidade com maior número de indígenas: 4.034, o que corresponde a mais da metade da população do município.

O ND+ conversou com o antropólogo e pesquisador do NEPI (Núcleo de Estudos de Populações Indígenas) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina, Pique Weitcha, para entender os impactos do marco temporal, caso fosse aprovado.

Weitcha explica que o marco temporal estabelece que somente teriam direito a demarcação de terras os indígenas que estavam no território em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da atual Constituição Federal.

Sobre o impacto do marco temporal, caso fosse aprovado, o antropólogo explica que as terras indígenas demarcadas após 1988 poderiam perder a validade e as terras indígenas que estavam em processo de homologação e demarcação seriam canceladas. “Ou seja, cerca de 60% das terras indígenas brasileiras não existiriam mais, ou seriam reduzidas. É um número elevado”, comenta.

O antropólogo considera que o marco temporal é uma perda para a questão indígena, além de impactar na preservação do meio ambiente, na produção de oxigênio e na luta pela terra de direitos originários.

O antropólogo cita que a Terra Indígena de Ibirama tem, atualmente, cerca de 14.900 hectares. “Se o marco fosse aprovado, ela voltaria a ter 8 mil hectares, porque algumas terras foram ocupadas depois de 1988. Somando tudo seriam 37 mil hectares para serem demarcadas que são de ocupação tradicional. É uma luta constante que insiste em prejudicar a natureza e destruir com as demais questões em relação aos indígenas”, explica.

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