O número sete tem um significado especial para a jogadora que cansou de quebrar recordes. Foram sete Copas do Mundo e sete Olimpíadas, superando todo e qualquer atleta do mundo. Além disso, é a jogadora mais velha a marcar um gol em Copa do Mundo, ela o fez com 37 anos, três meses e alguns dias. Com a camisa amarelinha, é a jogadora que mais vezes entrou em campo. Cafu ficou para trás e foi ela quem tornou a camisa da seleção brasileira quase que segunda pele em 233 jogos desde sua primeira convocação.
Formiga é a jogadora que mais vezes defendeu a Seleção Brasileira – Foto: CBF/Divulgação/ND
São duas pratas olímpicas e um vice-campeonato mundial, além de quatro ouros e uma prata em Pan-Americanos e o hexacampeonato da Copa América. Os números, recordes e conquistas já mostram o tamanho de Miraildes Maciel Mota, mas a Formiga, a nossa Formiga, é ainda maior porque para conquistar tanto, ela precisou superar muito mais.
Nascida no dia 3 de março de 1978 em Salvador, descobriu o amor pelo futebol muito cedo, fazia dos campinhos ainda de barro do Subúrbio Ferroviário da capital baiana sua segunda casa. Ou a casa que acolhia seu talento porque na família, a paixão e o talento de Formiga não apenas não eram bem vistos como eram motivo de agressão.
Depois de jogadora conhecida e reconhecida, a volante falou sobre sua infância e sobre como a família foi um obstáculo para que ela mantivesse vivo o sonho de jogar futebol. Em casa, ela era agredida porque os irmãos não a queriam jogando bola no meio de meninos.
Mas, Formiga tinha o apoio fundamental: o da mãe. Dona Celeste Maciel Mota era a incentivadora, aquela que dizia para a pequena Miraildes continuar firme buscando seu sonho e era, ainda, a primeira patrocinadora da filha. Afinal, mesmo com todas as dificuldades financeiras enfrentadas pela família, era dona Celeste quem bancava a agem para que ela fosse aos treinos.
A carreira começou de maneira precoce e já aos 12 anos o futebol dominava seu coração. Aliás, o caminho é o mesmo de muitos jogadores e jogadoras de sucesso e, na verdade, o pontapé inicial na carreira foi na quadra, no futsal. Mas, pouco tempo depois, foi nos campos que Formiga começou a brilhar e escrever sua história. Revelação do Campeonato Baiano, aos 15 anos ela se destacou no Brasileiro e foi convocada para a Seleção Brasileira, vestindo a amarelinha pela primeira – de muitas – vez, aos 16 anos.
À essa altura ela já era chamada de Formiga e o apelido veio justamente no futebol. Ágil e intensa, Miraildes estava em todos os lugares do campo e o apelido pegou, pegou tanto que hoje, aos 45 anos, há muitas pessoas que sequer a conhecem pelo nome de batismo.
Dos 16 anos aos 43, Formiga se dedicou à Seleção Brasileira. Foram 27 anos, quase três décadas, 233 jogos e 37 gols com o número 8 brilhando e fazendo história.
Por clubes, Formiga defendeu muitos e de muitos lugares do mundo, Brasil, Suécia, França e Estados Unidos e também empilhou conquistas: tri da Libertadores, bi Mundial, bi da Copa do Brasil, campeonato Francês e Copa da França. Entre os clubes que atuou estão São José, Santos, São Paulo, Rosengard (Suécia), New Jersey Wildcats (Estados Unidos), Chicago Red Stars (Estados Unidos) e PSG, entre outros.
Formiga tinha referência em casa e, em campo, o capitão Dunga
Na década de 1980, quando Formiga se apaixonou pelo futebol e começou a pavimentar o seu caminho e o de muitas outras que se inspiraram e se inspiram na jogadora mais longeva do futebol brasileiro, a referência era a mãe.
Foi Dona Celeste quem a fez continuar, superar o machismo dos próprios irmãos – Formiga tem quatro –, superar as dificuldades e seguir em frente. Não é incomum vê-la fazendo referência à mãe que, hoje, tem 76 anos. “Uma mulher guerreira, que criou os filhos sozinha. Teve oportunidade de dar os filhos e falou: não, vou criar os cinco”, disse em uma entrevista à Marie Claire.
Formiga esteve em sete Copas do Mundo e sete Olimpíadas – Foto: Sam Robles/CBF/Divulgação/NDCom cinco filhos, dona Celeste ava 14 horas do dia fora de casa, trabalhando e contava com a ajuda da vizinha para cuidar das crianças e é foi Dona Celeste a primeira inspiração de Formiga.
Em campo, a referência nasceu 15 anos antes e na outra ponta do país. O capitão Dunga é a maior referência dela no futebol. “Mulher no futebol? Não tinha. Mas gostava de ver o Dunga jogar. irava a força de vontade e a liderança em campo. Dificilmente a gente vê ele sorrindo, está sempre focado”, falou também em entrevista.
Aposentadoria, casamento e futuro
Formiga quebrou muitas barreiras. Mulher, negra, nordestina e lésbica, quebrou muitas barreiras e sempre foi voz ativa contra preconceitos. Ela foi escolhida para amar o futebol, esporte que, até a década de 1980, mulheres eram proibidas de praticar.
Em 1941, Getúlio Vargas assinou decreto que as proibiam de praticar o esporte. O fim do decreto veio apenas em 1979 e a regulamentação oficial do esporte só em 1983. Ou seja, o futebol feminino só deu os primeiros os há quatro décadas, quando, no masculino, o Brasil já era tricampeão mundial.
Formiga tinha 5 anos quando o futebol foi “liberado” para mulheres e trilhou um caminho difícil, com a estrutura precária dada às mulheres na modalidade e com o preconceito ainda mais forte do que, infelizmente, continua sendo.
Ela rompeu com estereótipos de feminilidade e desafiou “regras”. Voz ativa e crítica sobre a estrutura e visibilidade dada ao futebol, Formiga sofreu com o preconceito em suas mais variadas formas.
O casamento com Erica Jesus aconteceu apenas em 2022, mas as duas se conheceram ainda na década de 1990, quando elas tinham 18 anos e enquanto Formiga jogava no São Paulo, Erica defendia o Corinthians. Apenas em 2016 elas voltaram a se encontrar e o relacionamento foi firmado. O casamento aconteceu em dezembro de 2022 logo após a aposentadoria de Formiga, que não poupa palavras para se dedicar à amada nas redes sociais.
Aposentada dos campos, os planos de Formiga são de voltar seu trabalho para a gestão, a fim de melhorar o caminho para outras meninas e mulheres.
