Quando o assunto é mercado de trabalho, basta uma pesquisa na internet para encontrar números curiosos.
Diante de um cenário que inclui falta de mão de obra qualificada e desempregados, como explicar a desigualdade entre os postos e aqueles que precisam de ocupação?
Conforme dados da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua), divulgados pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), são 9,4 milhões de brasileiros sem uma ocupação no primeiro trimestre de 2023.
Já no que diz respeito às qualificações, uma pesquisa do ManpowerGroup, consultora de gestão de pessoas, relatou que a falta de qualificação profissional no país atingiu 81% — a principal dificuldade é encontrar novos talentos.

Entretanto, a realidade pode ser ainda mais desafiadora quando o assunto são as profissões do futuro, ou pelo menos aquilo que é esperado para os próximos anos. Isso porque a defasagem nas competências que são esperadas parece ser ainda maior.
Informações do Fórum Econômico Mundial indicam que 23% das profissões atuais devem ser modificadas até 2027.
Mas como analisar todos os dados e trilhar o panorama correto para o futuro? Em uma realidade que inclui as mudanças da tecnologia e ascensão da inteligência artificial, como optar por uma carreira que será relevante?
Talvez a resposta esteja em encontrar algo com um significado amplo, pelo menos de acordo com a professora e recém-formada em neurociência, Ana Paula Schmitt Santiago, de 40 anos.
Com desejo de encontrar respostas, direito, letras e neuropsicopedagogia foram outros assuntos que impulsionaram as formações — o foco era achar uma nova forma de aprender, ensinar e se conectar.
A busca pela neuropsicopedagogia foi durante a pandemia e o ponto de partida começou ao perceber a dificuldade de alguns alunos em sala de aula.
O próximo o foi a formação em neurociência — concluída em 2023. Mais que ensinar, as formações foram importantes para se aproximar dos estudantes.
“É esse diferencial que eu busco levar, eu preciso conhecer os meus alunos, eu preciso saber quem eles são, preciso identificar, identificar como cada um aprende”, explica Ana, que costuma criar os planejamentos junto com a turma.

Com agens pelo Tribunal de justiça de Santa Catarina, escolas particulares e públicas, incluindo a experiência como gestora, a nova guinada na carreira abriu as portas para o atendimento clínico, espaço em que a profissional contribui com a identificação de possíveis problemas e o acompanhamento de crianças e adolescentes — o convite para trabalhar com o atendimento veio durante a faculdade de neurociência.
“Acho que o meu diferencial é querer e fazer. É conhecimento. Eu acho que a base é formação, é conhecimento, eu sempre defendo isso”, completa a educadora.
Entre a sala de aula, a oferta de cursos para os professores e os atendimentos, existem novos desejos que surgiram para complementar os sonhos antigos, como a vontade de ser diretora de uma escola.
Entretanto, agora o propósito está ligado com o objetivo de ter a própria clínica, oportunidade que só foi possível por conta dos novos aprendizados.
“Se eu sinto uma necessidade de saber algo, eu não sou daquela que vai no Google e procura um conceito. Aprendi a buscar alguma formação, uma base que pudesse me dar sustentação para aquilo que eu acredito”, finaliza Ana.
Idades diferentes, pensamentos parecidos 3k472k
Se alguns buscam formações complementares para aprimorar a abordagem, existem aqueles que investem em cursos para compreender as novas responsabilidades, ainda mais no início da carreira.
No caso da analista de mídias sociais, Amanda Namie da Mata, 22, os anos de pandemia serviram para ir em busca de cursos digitais, principalmente aqueles que contribuíssem com o desenvolvimento no estágio em uma agência de marketing.
“Precisava aprender aquilo para fazer as tarefas do dia a dia. Depois continuei trabalhando com marketing, então foi importante para seguir na área, porque eram conhecimentos que eu não tinha adquirido na faculdade”, diz Amanda.

Na época, a procura foi por trilhas voltadas à produção de conteúdo para web, SemRush, SEO, Toolkit e inbound marketing, além de de design de produção, comunicação e oratória, e liderança, capacidade de aprender e resiliência — os três últimos foram escolhas próprias, sem ligação com o trabalho.
Agora, efetivada em uma empresa, a profissional conta com um planejamento de desenvolvimento profissional, com conhecimentos relacionados à área de atuação.
“Os cursos complementam muito a aprendizagem normal, principalmente quando são coisas que você não aprende na faculdade, que era o meu caso. Dependia do curso para ter o conhecimento sobre aquelas ferramentas e assuntos”, esclarece Amanda.
O que é esperado do profissional do futuro? 2u1v4z
Se por muito tempo as chamadas hard skills, ou habilidades técnicas, foram as principais responsáveis por direcionar as escolhas e contratações das empresas, agora existe um novo conjunto de competências na disputa: as soft skills, relacionadas ao comportamento.
Conforme dados de uma pesquisa realizada pelo Infojobs, plataforma de recrutamento e seleção, 77,2% dos profissionais entrevistados acreditam que as competências técnicas e comportamentais são igualmente relevantes.
Impulsionado pelo trabalho híbrido ou home office, a comunicação, empatia, gestão e disciplina começaram a surgir como requisitos para determinadas vagas, de acordo com o perfil das empresas.
“A formação hoje, cada vez mais, não está sendo tão valorizada, claro que tem área que é mais do que outra, mas cada vez menos eu percebo isso. Ter a formação é o mínimo, mas a formação, ela em si, não vai te trazer uma vaga”, opina a gestora de projetos, Simone Ferreira Coelho.
Em um modelo de trabalho que foi modificado pelas interações da tecnologia e que promete ser transformado no futuro, os recrutadores começaram a buscar pela identificação com a forma de pensar das instituições.
“Olhar mais para as competências comportamentais, o “fit cultural”, do que a formação ou uma experiência prévia. Porque, às vezes, é muito mais fácil treinar, educar esse profissional em termos técnicos”, diz o psicólogo e líder de recrutamento e seleção, Fernando Muller.
No novo modelo de demanda e entrega, que começa a ser desenhado conforme os os do futuro, mais do que compreender uma planilha ou os cálculos do mês, é essencial aprender sobre a gestão do próprio tempo.
“Devem ser autogerenciáveis e as empresas também. Com base nisso, é preciso cobrar mais entregas. Não dá para ficar acompanhando o como fazer, mas sim dar, determinar metas, entregas e acompanhar. Tem toda adaptação da empresa para trabalhar com base nos resultados e não na atividade em si, mas também na pessoa de se autogerenciar”, explica Simone, que acredita que o grande diferencial do profissional do futuro será aquilo que diferencia humanos e máquinas.
Para a head de consultoria e serviços, recrutamento e seleção e gestão de pessoas, Carolina Pizolati Farah, uma alternativa para os próximos anos pode estar no modelo de carreira escolhido.
“Temos que ser mais especialistas, conhecer tecnicamente, mas ao mesmo tempo temos que ser multidisciplinares. Quanto mais eu entender um pouco de todas as áreas, melhor eu vou ser”, comenta a especialista, sugerindo a carreira em “T” como uma solução compatível com o mercado — é possível seguir a formação em determinada área sem deixar de lado conhecimentos gerais em outros segmentos.
Por mais que os requisitos do futuro ainda estejam em definição, uma coisa é certa: novas tarefas, métodos e comparativos vão surgir. Por isso é imprescindível estar preparado.
“Cada vez mais vão surgindo novas responsabilidades, novas atribuições, o que faz com que as pessoas também tenham novas habilidades para que elas consigam se adaptar a esse mercado de trabalho”, finaliza Carolina.
Cada vez mais humano l74o
Se o conhecimento técnico será modificado pelas demandas e necessidades, o comportamental deve seguir o mesmo caminho, pelo menos é o que indica o mercado.
Pensando nos próximos anos, a comunicação, empatia e pensamento crítico estarão em alta. Mais que manter as entregas, será preciso aprender a solucionar problemas — o foco será melhorar a produtividade e o relacionamento interpessoal.
“Minha recomendação para se desenvolver a autogestão é que a pessoa avalie o trabalho, as atividades, as circunstâncias e crie metodologias para se estruturar. Existem várias ferramentas, por exemplo, ferramentas tecnológicas que permitem controlar e organizar os seus projetos”, aconselha a pesquisadora e consultora em definição de modelos de trabalho e conexão de times distribuídos, Sylvia Hartmann, que ressalta o papel da autogestão para garantir as entregas no fim do dia sem que exista a cobrança ou o gerenciamento dos superiores.
Na busca pelo controle do próprio tempo, desenvolver o senso crítico e a empatia, por exemplo, também serão formas de aprimorar o trabalho.
“A inteligência emocional é fundamental nas relações do dia a dia porque a gente consegue ter uma interação melhor com o outro”, ressalta a diretora de atendimento, palestrante, mentora e professora de inteligência emocional e softs skills, Paula Araujo.
Em um mundo cada vez mais conectado com as máquinas, o humano precisará aprimorar a comunicação.
“Trabalhe a harmonia dos pilares da inteligência emocional, ou seja, o autoconhecimento, autogestão, empatia, gestão dos relacionamentos para poder, cada vez mais, ter consciência do que está acontecendo e estar presente”, ressalta Paula.
Se a inteligência artificial será capaz de facilitar a rotina de trabalho, fazendo entregas que hoje são manuais, a ideia é que o tempo seja utilizado para desenvolver aquilo que a tecnologia ainda não tem — fatores que agora também contam na hora da contratação ou mudanças de cargo.
“É pela inteligência emocional que as pessoas se compreendem, se expressam e gerenciam suas emoções, melhorando as capacidades comunicativas e habilidades em gerir e mediar conflitos, independente do ambiente em que se encontram. A inteligência emocional contribui com a istração do estresse, tomada de decisões mais ponderadas e desenvolvimento da empatia”, destaca a fundadora da Desestresse Desenvolvimento Humano, consultora organizacional e facilitadora de treinamentos incompany, Luana Segato.