– Não, a escola não foi interditada! – apressou-se em dizer uma professora, ao saber que havia um jornalista na secretaria da Escola de Educação Básica Lauro Müller, a última escola pública que funciona com atividades regulares de ensino no Centro Histórico de Florianópolis. Antes dela, as antigas escolas Antonieta de Barros e Celso Ramos foram desativadas e abandonadas pelo governo do Estado em razão de problemas de manutenção e de segurança pública, respectivamente.
A professora fez tal afirmação na quinta-feira (8), porque um dia antes uma equipe da Defesa Civil esteve no local para promover uma vistoria preventiva. Constatou pequenas rachaduras em paredes e infiltração em salas de aula por causa do telhado deteriorado. Algumas providências já estão sendo adotadas pela prefeitura, uma vez que o prédio histórico foi cedido pelo governo para o município há quase 10 anos. Mas, no geral, a edificação necessita de uma reforma completa, inclusive para resgatar suas características de originalidade. Tal iniciativa não depende da direção da escola, mas de um conjunto de entidades, como a Secretaria de Educação, o Ipuf (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis), a Sesp (Secretaria de Serviços Públicos) e o serviço de patrimônio histórico da cidade, porque o imóvel é tombado. A última reforma física foi inaugurada em 1991, pelo governador Vilson Kleinübing, como parte das comemorações dos 80 anos de atividades da escola.
A EEB Lauro Müller oferece ensino da rede pública do fundamental e médio, seu espaço físico dispõe de salas, biblioteca, sala de informática, auditório, quadra de esporte e um generoso espaço externo para recreação.
Seus ambientes são amplos e bem arejados, conservando sutilezas importantes, como o piso de ladrilho hidráulico nas áreas comuns, além de belos detalhes arquitetônicos originais.
A hoje denominada EEB Lauro Müller é a mais antiga unidade pública de ensino em funcionamento no Centro de Florianópolis, considerando-se o prédio próprio. O Instituto Estadual de Educação tem 126 anos, mas sua sede atual só foi inaugurada em 1964. A escola Lauro Müller começou suas atividades educacionais em 22 de maio de 1912 e mantém-se ativa na Rua Marechal Guilherme, Centro Histórico da Capital.
Há mais uma escola pública antiga na região central, a Silveira de Souza. Fica na Rua Alves de Brito, mas não funciona mais com ensino regular. O prédio histórico pertencente ao Estado foi cedido à prefeitura para execução do projeto EJA (Educação de Jovens, Adultos e Idosos) e também para atividades musicais.
Revolução que marcou a educação
Tanto a Lauro Müller quanto a Silveira de Souza são do mesmo período – a década de 1910 -, correspondendo a um projeto de governo de Vidal Ramos (1910-1914), considerado o fundador da educação pública catarinense. Esse projeto – a Reforma Orestes Guimarães (1911-1919) representou a grande transformação do ensino primário em Santa Catarina e o Grupo Escolar Lauro Muller foi a sua escola-modelo. Orestes Guimarães era um educador paulista, contratado pelo governo catarinense para modernizar a instrução pública catarinense, nos moldes da realizada em São Paulo. Por ser escola-modelo, conforme o historiador Paulo de Nóbrega, o “Grupo Lauro Müller” custou aos cofres públicos estaduais aproximadamente o dobro dos outros seis grupos escolares da Reforma Orestes Guimarães em Santa Catarina. A exemplo de outras escolas, o prédio é patrimônio histórico e cultural do município.
À época (1911), o governador Vidal Ramos afirmou: “Prestei a maior atenção à construção do edifício destinado a este Grupo (Lauro Müller), assim como ao seu mobiliário e material de ensino, porque ele deve servir de modelo aos demais, que vão sendo fundados no Estado”. A relevância social do Grupo Escolar Lauro Muller também era conferida pelo fato de receber as alunas da Escola Normal Catarinense (atual IEE), que ali realizavam as suas práticas de ensino, e também os professores dos grupos escolares e das escolas isoladas e reunidas de Santa Catarina.
O nome do colégio é uma homenagem a Lauro Severiano Müller (1863-1926), nascido em Itajaí, que foi governador de Santa Catarina, ministro de Estado e senador durante o período da Primeira República.
Ensino com características universais
Funcionando atualmente como EJA, o antigo Grupo Escolar Silveira de Souza, na Rua Alves de Brito, também conserva sua originalidade física, necessitando de reparos constantes, por causa dos efeitos do tempo. Ainda assim, é um belo conjunto histórico, que tem internamente o formado de “U”, com duas alas separadas – correspondentes às seções “Masculina” e “Feminina”, porque até a década de 1950 meninos e meninas não eram misturados nas classes. A escola foi inaugurada em 28 de setembro de 1913. Além de servir à educação, em época de eleições, como este ano, a escola concentra diversas seções da 12ª Zona Eleitoral de Florianópolis. E preserva em seu jardim duas centenárias jaqueiras que, no ado, divertiam as crianças que estudavam no colégio.
Um detalhe interessante é que, situada em zona nobre da cidade, a escola abrigou até 2009, no ensino regular, alunos de todas as classes sociais. E era muito procurada pelas famílias moradoras das comunidades do Maciço do Morro da Cruz. O nome do colégio é uma homenagem ao poeta, jornalista e político João Silveira de Souza (1824-1906), autor de “Minhas Canções (1849) e patrono da cadeira 18 da Academia Catarinense de Letras.
Um apaixonado pela educação
Nascido em 1866 em Lages e falecido em 1954 no Rio de Janeiro, Vidal José de Oliveira Ramos Júnior foi o governador que revolucionou a educação pública de Santa Catarina durante seu período de governo, entre 1910 e 1914. O Estado já tinha colégios públicos isolados, mas muitos funcionavam em condições físicas precárias e dependiam do esforço dos professores para garantir estrutura ao ensino básico, especialmente o primário, essencial para a alfabetização e inserção no mercado de trabalho.
Ramos tinha tal paixão pela educação que doou uma área de sua propriedade na região da Praia de Fora, em Florianópolis, para a Companhia de Jesus. A Chácara Pamplona transformou-se no Ginásio Catarinense, hoje Colégio Catarinense, istrado pelos jesuítas e historicamente voltado à educação da elite estadual (funcionou muito tempo como internato exclusivamente masculino).
Escolas fundadas por Vidal Ramos
Vidal Ramos teve uma visão de Estado ao comandar a grande revolução da educação catarinense no início do século 20. Com a assessoria do educador Orestes Guimarães esquadrinhou as bases da educação descentralizada, abrindo escolas nos principais municípios da época:
– Grupo Escolar Conselheiro Mafra, ville, fundado em 15 de novembro de 1911
– Grupo Escolar Lauro Müller, Florianópolis, em 22 de maio de 1912
– Grupo Escolar Jerônimo Coelho, Laguna, em 10 de dezembro de 1912
– Grupo Escolar Vidal Ramos, Lages, 20 de maio de 1913
– Grupo Escolar Silveira de Souza, Florianópolis, 28 de setembro de 1913
– Grupo Escolar Victor Meirelles, Itajaí, 4 de dezembro de 1913
– Grupo Escolar Luiz Delfino, Blumenau, 30 de dezembro de 1913