Se o português já é um desafio e tanto para os brasileiros, imagina para quem chega ao país e não consegue se comunicar? Seja para pedir informações ou fazer novos amigos, a linguagem é o principal elo entre as pessoas.
No Norte da Ilha, os educadores da Escola Básica Municipal (EBM) Professora Herondina Medeiros Zeferino identificaram a dificuldade de aprendizagem e de interação dos estudantes estrangeiros em sala de aula.
Para mudar o cenário e apresentar a língua portuguesa de uma outra forma, a ideia foi oferecer encontros no contraturno, com atividades extracurriculares que estimulam a fala e a escrita.
“A ideia é que eles consigam se enturmar, que consigam fazer amigos. É o português como uma ferramenta de convívio na escola, para eles conseguirem conversar com os professores, com os colegas, porque quando eles chegam, eles ficam muito retraídos, não entendem nada, falam muito pouco”, conta o professor Romário Conrad, responsável por estimular a turma de espanhol na prática da nova linguagem.
Acompanhando o crescimento no número de estrangeiros desde 2014, o olhar de atenção foi instigado pelas situações do cotidiano, notadas pela direção.
“Muitos saem de seus países como refugiados ou para buscarem melhores condições de vida. Além disso, em sala de aula, alguns estudantes se sentem excluídos por não conseguirem se comunicar”, explica a diretora Edilene da Silva Monteiro.
Ao todo, 42 estrangeiros estão matriculados na unidade e 30 participam das aulas. Os grupos são divididos entre aqueles que falam espanhol e quem fala inglês. As reuniões são semanais e a adesão depende do interesse da família e do próprio estudante.
Mais do que compreender a forma correta da língua, tarefa que deve ser executada no ensino regular, o intuito é desenvolver o português de uma forma leve e descontraída, quebrando as barreiras que impedem a compreensão, a fala e a escrita — e os termos e significados são os principais adversários.
“O que complica muito para eles é isso, essas palavras que existem nas duas línguas, mas que têm um significado, que eles precisam aprender a pôr em uso. Eles já conhecem o uso do espanhol e têm que reaprender a palavrinha com um significado totalmente diferente no português”, enfatiza o professor.
Por serem línguas irmãs, a pronúncia pode ser parecida, mas o sentido é totalmente diferente. Entretanto, a educação tem um papel essencial para amenizar o medo da exposição em público.
“É uma forma da escola afirmar que sabe da existência desse público e que está comprometida em garantir o acolhimento e a rápida apropriação da língua portuguesa, condição indispensável para que eles continuem seus estudos aqui no Brasil”, ressalta Edilene.
A mesma dificuldade é vivenciada com a família, que muitas vezes não consegue compreender os recados. Por isso, os pais participam de um grupo do WhatsApp para ter o aos comunicados traduzidos, expondo dúvidas e questionamentos.
Colocando a mão na massa 2j252
Após a adesão ao projeto, o o seguinte é a conversa com o educador. O objetivo é compreender há quantos anos o jovem está no país, se já fala o português e quais são as principais dificuldades — informações essenciais para planejar as atividades. Com uma didática bilíngue, os trabalhos são pensados para extrapolar os muros da escola, chegando em casa.
Isso porque os responsáveis podem auxiliar nas pesquisas, descobrindo curiosidades da cultura nacional. O trabalho preferido de Carola Renata Nabarro, da Argentina, e de Milan Sebasthian Bonsignore Reyes, da Venezuela, comprova a tese.
Em uma folha de sulfite, o desafio era listar, em português, a comida e as cores preferidas, o animal de estimação, os membros da família, os jogos e os brinquedos.
A oportunidade de pintar e desenhar despertou a atenção da turma, que sem perceber começou a treinar as palavras do cotidiano, que fazem diferença no relacionamento escolar, mas também no diálogo com os vizinhos e com a comunidade — seja na hora de ir ao supermercado ou à praia.
A próxima problemática já foi apresentada: agora, eles precisam escrever uma receita típica de determinados estados brasileiros.
A tradução também faz parte da rotina. O desafio é mencionar, em espanhol, como determinadas ações são feitas e depois reformular a frase na língua portuguesa. É assim que eles conseguirão ler, escrever, falar e brincar com os demais estudantes.
As aulas no contraturno também serviram para mostrar que existem outros estrangeiros na escola, já que muitos deles ainda não se conheciam.