Desde o fim de março, quem a pelo Largo do Fagundes, no Centro de Florianópolis, se depara com uma jovem de rostos largos, percing no septo e olhar confiante desenhada em um mural na parede das Lojas Pompeia. Rodeada por antúrios, mandalas e bonecas, a jovem retratada é a artista transexual Jehnny Glow, de 23 anos, e natural de Florianópolis.

Jehnny foi convidada durante um evento realizada na Casa da Criança. O seu show surpreendeu Tuane Ferreira dos Santos, uma das quatro artistas que assinou a obra. A jovem se enquadrava na proposta do mural que elas queriam inaugurar na Capital, por meio do Street Art Tour, em homenagem ao dia da mulher.
Além de Tuane, assinam o mural Mariê Balbinot, Gugie Cavalcanti e Laura Loli. “Elas queriam representar o feminino. A mulher de todas as formas, e não apenas o ‘preciso nascer mulher para ser mulher’ ”, explica Marina Tavares da Cunha Mello, produtora do projeto.
Jehnny era a pessoa que buscavam. Ao retratá-la, cada artista emprestou a sua principal qualidade: o desenho das mandalas, a pintura da botânica, o retrato, a representação de bonecas. O resultado é um mural vivo e forte, que capta todos os detalhes de Jehnny, a exemplo dos olhos assimétricos. O trabalho foi feito durante uma semana, e lançado no dia 28 de março.

Glow mora no Norte da Ilha de Santa Catarina. Para ela, a fama da mãe também ajudou ela a ser escolhida para a obra. Rita dos Santos, ou Feijão, como é conhecida em Florianópolis, trabalha há 15 anos na praça XV, e é uma referência em dreads e penteado afro.
Cantora e compositora desde os 16 anos, Jehnny Glow documenta na sua obra a transição que viveu. No início, ela ainda era Johnny Beng – um “antigo eu” que faz questão que seja contado e registrado. Foi aos 20 anos que descobriu Jehnny. “O Johnny foi a semente artística para colher a Jehnny Glow”.
Os seus shows misturam composições autorais e covers, sobre temas como amor próprio, sexualidade, aceitação. O repertório é sempre diverso: no show já citado na Casa da Criança, cantou desde o gospel ‘Faz um Milagre em Mim’ (Regis Danese), até o sucesso ‘O Sol’ (Vitor Kley). A sua preferência é pelas músicas dançantes.
“Não botei fé. No dia, perdi o celular no Titri (Terminal da Trindade). Só na semana seguinte que vi as mensagens das meninas. ‘A Tuane comentou que te conheceu ontem. Queria saber se você topa’. Fiquei orgulhosa. Meu nome ligado a algo daora, não a algo triste”, conta, ao lembrar do dia que conheceu a artista.
Na semana seguinte, Gugie tirava a foto de perfil que serviria como base ao mural, produzido na última semana de março. “Quando cheguei e estava quase pronto, fique emocionada”, lembra. Por ser negra e transexual, considera a obra uma homenagem para todas as mulheres.
Ao ar pelo quadro de oito metros, o sente como uma mensagem pessoal. “Ele me diz: continua sendo o que você é. Faz o que você quer. Eu estou ali. Sou virginiana e quero ser muito grande”.