O construtor da primeira Igreja de Itajaí no Litoral Norte de Santa Catarina foi Simeão, um escravo que hoje leva o nome da homenagem de valorização do negro na sociedade itajaiense. Todos os anos, no mês da Consciência Negra, a prefeitura de Itajaí homenageia uma personalidade negra significativa para a cidade.
Este ano, a homenageada tem como principal característica amar cuidar de pessoas, uma qualidade significativa diante dos quase dois anos em que o mundo enfrentou a pandemia da Covid-19. Nestes 1 ano e 8 meses em que enfrentamos coronavírus, tivemos que cuidar de nós mesmos e dos outros, mantendo as medidas de prevenção à Covid, mas através da profissão, a homenageada foi além.
Maria Paulina Pereira da Silva, de 44 anos, é enfermeira e atuou como diretora de Atenção à Saúde em Itajaí no auge de uma pandemia. A profissão foi uma escolha natural, cuidar de pessoas esta na personalidade de Maria e a enfermagem foi uma paixão que se tornou um casamento de 23 anos.

“Não lembro exatamente quando me deu esse ‘estalo’. Eu sempre cuidei das pessoas ao meu redor e com muito prazer. Por isso a escolha foi natural e orgânica, começou num caso de amor tórrido com o curso durante a universidade que me trouxe a um casamento mais que feliz com a profissão que já dura mais de 23 anos”, conta Maria.
Mulher preta 646b5a
Enquanto mulher preta, para Maria, o maior desafio da vida é viver. “Existir enquanto mulher preta na sociedade atual já é o desafio, resistir às mais variadas formas de violência às quais somos expostas diariamente, preservar minimamente a auto estima, a saúde mental e criar meus filhos também pretos com um pensamento livre, consciente, amoroso e independente”, destaca Maria.
“Mulher preta, filha, mãe, irmã, sobrinha, prima, amiga, amante, cheia de dúvidas e temores. Em busca de viver a vida da maneira mais plena e presente possível”, são alguns adjetivos que Maria usa para tentar se definir, mas ser uma mulher preta no auge de uma profissão tão importante é impossível fazer caber em descrições.
Prêmio por viver e não apenas existir 1b715v
Receber um prêmio de valorização negra que carrega o nome de um homem tão importante para o povo negro itajaiense e para a construção da cidade, como Simeão, é de grande relevância para a comunidade negra como um todo.
“O sentimento é de alegria pela homenagem claro, de surpresa imensa por considerar o tanto de pessoas pretas as quais iro que também poderiam ou deveriam receber esse prêmio e de gratidão por servir de alguma inspiração a quem quer que seja”, destaca Maria.

O prêmio vai além da profissão, da atividade, ou de ações do negro na sociedade. Assim como o homem que leva o nome do prêmio, o Simeão traz informações históricas sobre as quais Itajaí foi fundamentada e como a cidade olha para os negros atualmente. Não como alguém que exerce um papel, uma carga, mas uma história, uma vida impossível de ser resumida ou rotulada.
“Eu gostaria de receber essa homenagem não por ser uma ‘Enfermeira Negra’ atuante na pandemia, não apenas como forma de reconhecimento pelo trabalho prestado porque o cumprimento do meu dever com a maior eficiência possível encaro como obrigação. A pandemia, foi o nosso momento na história, não poderiam ser outras pessoas, precisávamos estar lá e tem sido uma honra de fato poder estar”, destaca Maria.
“Acolho esse prêmio como reconhecimento de toda minha caminhada na vida e não apenas como profissional. Neste ato, represento tantas outras existências que como a minha que permanecem resistentes e de pé. Trago aqui como âncoras e molas propulsoras minha ancestralidade, meus valores, meus amores e que esse prêmio hoje ofertado a mim, possa trazer luz a outras mulheres pretas que diariamente enfrentam os mesmos desafios e colhem as mesmas alegrias que eu independente de onde elas estejam e qual papel cumpram na sociedade”.
Enfrentamento à Covid-19 m3r56
Por atuar como diretora de Atenção à Saúde em Itajaí, Maria não teve outra alternativa a não ser enfrentar a pandemia de Covid-19 de peito aberto e com muita coragem, apesar do medo.
Maria comenta a atuação na pandemia de Covid-19. “Foi de uma alegria absurda estar disponível através da profissão para servir aos outros num momento tão estratégico da história, sou extremamente grata por isso. Foi cansativo pelas horas exaustivas de trabalho, desafiador pelos mais variados tipos de medo que experimentamos e pela convivência diária com a morte. Revoltante pelo descaso de algumas autoridades e alguns membros da sociedade”, define a enfermeira.