O ano de 2022 começou com uma visita especial à Ilha do Campeche, em Florianópolis. Se o local recebe dezenas de turistas por dia, no último dia 1° de janeiro, uma chamou atenção dos que aproveitavam as belezas da Ilha. Uma medusa de 60 cm de diâmetro se aproximou dos banhistas que acabavam de ancorar no local e atraiu olhares dos mais curiosos e até mesmo de quem já conhecia a espécie.

Uma das primeiras pessoas a avistar a “medusa gigante” foi a monitora cultural do Programa de Visitação e Conservação da Ilha do Campeche, Camila Andreussi. Ela, junto de Dafne Reinisch e Felipe Resende, fez imagens que viralizaram na internet após o aparecimento do animal.
“Eu estava na praia, aguardando o barco com os visitantes chegarem, porque faz parte do trabalho receber as pessoas que descem na Ilha, e vi uma sombra na água. Era uma sombra grande, me aproximei e vi que era uma água-viva maior do que as que estamos acostumadas a ver. Lembrei que ela era parecida com a que tinha aparecido em 2020, e chamei minha coordenadora”.
Na sequência, ela e Dafne começaram a registrar imagens do animal, e contataram o professor da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), Alberto Lindner, responsável pelo laboratório de Biodiversidade Marinha da instituição.
A medusa Drymonema gorgo 64v6z
Segundo o professor Lindner, a medusa de nome científico Drymonema gorgo é considerada rara. “É uma espécie que tem distribuição entre a Argentina até o Rio de Janeiro. Mas em toda a distribuição dela, ela é considerada rara. Não é que tenha algo especial aqui em Florianópolis, ela tem até mais registros em Cabo Frio e Arraial do Cabo [ambas no RJ], por exemplo”, explica.
Sobre a segunda aparição do animal na Ilha do Campeche, sendo a primeiro registrada em fevereiro de 2020, o professor explica um dos motivos para haver mais imagens feitas na costa da Capital.
“É um local que tem uma água relativamente clara, e há muitas pessoas olhando, uma equipe de monitores, que acabam registrando e encaminham as imagens. Pode até ser que haja em algum outro local, mas não chega até nós”, detalha o professor.
Veja imagens da “medusa gigante” flagrada novamente em SC: 53k1q
As imagens feitas por Camila, por exemplo, foram acompanhadas dos olhos curiosos dos turistas e moradores que chegavam para curtir o eio na Ilha do Campeche, que é um patrimônio nacional.
“Como ela estava no raso, por medida de segurança do animal e até das pessoas, nós tiramos da praia. Ela estava quase encalhando e as pessoas estavam se aproximando. Para evitar acidente, com apoio da Associação de Barqueiros da Praia do Campeche, foi feito o procedimento de colocar ela num balde grande, e levar para o mar aberto, para ficar segura”, explica Camila.
Qual o risco para banhistas? 505k2p
Aos mais preocupados, a boa notícia é que este animal apresenta risco baixíssimo aos banhistas. O professor Alberto Lindner lembra que “é considerado um risco baixíssimo. É um animal bastante grande, mas o envenenamento é muito leve, quase inexistente. Deve-se evitar tocar, porque ela pode queimar um pouquinho, mas nada parecido com a Caravela Portuguesa, por exemplo”.
Em geral a orientação é a mesma para quando se avistar qualquer um desses animais. “A orientação é se afastar. Se observar qualquer água- viva, de qualquer espécie, na dúvida, deve se afastar, e entrar e contato com os guarda-vidas”, explica o professor.
Na ilha do Campeche, é possível avisar aos monitores. Os responsáveis podem tentar, como foi feito na Ilha, levar o animal para um lugar mais seguro.
Medusa nadava próxima ao barco que chegava com turistas – Vídeo: Felipe Resende/Reprodução/ND
“Quem teve contato ficou assustado, perguntando se era perigosa ou não, mas como já tínhamos visto, informamos que o risco não era tão grave, mas ainda assim tivemos o maior cuidado para proteger o animal”, lembra Camila.
“Gostamos de lembrar e enfatizar aos visitantes que o oceano é a casa delas, o ambiente pertence a elas. Nosso papel é se afastar, respeitar e não incomodar esses animais”, finaliza.
Medusa e outros animais em SC d6465
Cabe lembrar que muitos dos animais considerados raros nos dias atuais só ganharam esta condição por conta da pesca e da caça. A medusa avistada na Ilha do Campeche pode estar entre estes organismos, conforme especula Lindner, mas não há informações oficiais sobre isso.
“O Litoral foi bastante modificado em relação aos animais marinhos, por conta da pesca e da exploração de recursos. A gente vê, em muitos casos, animais que estão ‘voltando’, como é o caso das baleias, animais que ficaram raros por conta da pesca e caça, mas que estão retornando, como a Jubarte e a Baleia Franca. A medusa gigante talvez fosse mais abundante no ado também”.
Sobre os demais animais que chama atenção, estão os chamados ‘animais de frio’. O professor relembra alguns casos: “Teve o elefante marinho em Balneário Camboriú há uns anos, mas temos agens de orcas também, e às vezes há registro de peixe-lua. Com o celular, fica mais fácil de ter esses registros”.
Ele ainda relembra um caso que considera emblemático. “O ‘Cação’, Tubarão-mangona, era comum no Litoral de SC. Ele não é agressivo com humanos, mas foi muito pescado, no raso mesmo, e hoje está praticamente extinto. De vez em quando, alguém pesca ele, mas é um animal raro. O manejo da pesca pode fazer com que ele volte com o tempo”, aponta.
Por fim, vale lembrar que a “medusa gigante’ apareceu, coincidentemente, na mesmo cidade onde foi descrita pela 1ª vez, pelo professor Fritz Müller, que morou na Capital por 12 anos. No entanto, maiores especificações, como descrição e nomeação do animal, só surgiram quando o pesquisador já residia em Blumenau, no Vale do Itajaí, em 1883.